domingo, 31 de agosto de 2014

Um parto que durou 22 meses. O nascimento de Serena, Patrícia, Erick e Aurora.

27 de maio [de 2014]5 da manhã.Já era rotina, acordar cedíssimo com contrações. Mas... aquele dia era diferente. Mais forte. Mais intensas. No intervalo, diferente de todas as outras vezes nas últimas semanas, eu não conseguia "seguir a vida", andar, pensar. Entre uma e outra contração, só queria... dormir.
"Já são quase 41 semanas de gravidez. E mais essa gripe, essa tosse que nunca mais vai embora. E o pé em recuperacao. É, é só o cansaco acumulado. Logo passa".
Não passou.Deitada no sofá, uma briga entre o cérebro: "Tu teve consulta ontem mesmo, lembra? E tá tudo normal. Ainda vai demorar, isso é só mais um treino". O corpo dando um belo chute em qualquer racionalidade, a cada onda de dor fora de ritmo.
Fora de ritmo.Era esse meu medo. Do não saber, do não ter como me basear. Eu, rainha da racionalidade e das evidências, que precisava ver pra crer e analisar cada detalhe para confirmar e confiar.As horas passando.
Contrações a cada 2 minutos. A cada 5 minutos. A cada 3 minutos. A cada 2, outra vez.Fora de ritmo.Fora de controle.
Tapa na cara, Patricia.Trabalho de parto.Parir.Um ser saindo de mim, sem anestesia.Dor.Ah, a dor.Medo. Insegurança. Falta de confiança.
Trinta anos como mulher.Sim, quem é mulher, sabe. Que tu é... menosprezada. Subjugada. Desacreditada. Todos os dias, nas coisas que importam e nos detalhes."Só podia ser mulher", no trânsito."Certeza que deu pra alguém", no trabalho."Nota alta? Só porque é bonita!".Trinta anos duvidando de mim.
Anos de luta contra depressão.Anos sem me acreditar verdadeiramente capaz, e aceitando o que dava certo como "sorte".
A dor de saber-se incompetente.Com um corpo incapaz.Quando 22 meses antes aquele médico olhou no fundo dos meus olhos e mentiu, sem qualquer pudor: "Você não tem dilatação".
O luto.E a dor da descoberta, da mentira pela conveniência dele.Foram tão fortes como estavam sendo aquelas contrações.
Sim, doeu.Doeu muito.Cada fibra do meu ser, cada pontada de dor na barriga, de me fazer perder a força nas pernas... me dizendo: seja forte!Doeu.Doeu porque precisava.
Eu precisava morrer, para nascer.Outra vez.Nascer um bebê, renascer uma mãe.Morrer, aquela mulher que não se via capaz, que acreditava mais na sorte e nas confluências planetárias que em si.
Cada contração, uma transformação.VOCÊ É CAPAZ.Você é perfeita.Seu corpo é perfeito, não importa o que todos tenham dito.
Um banho quente.Muito quente.E a dor... cedendo. E a mudança, cada vez mais forte.Num dos raros momentos de descanso, só me passa pela mente que não é possível que meu corpo esteja mentindo pro meu cérebro.- Amor, ainda não ritmou??- Ainda não. Pode demorar, mas você vai conseguir.
Não, eu não vou conseguir.Eu não quero mais, eu preciso dormir, eu tô cansada, eu tô com dor, eu desisto. Eu, eu, eu.Esquece Patricia. Teu ego não manda mais. Agora não é você no comando.É a Natureza, é o seu bebê.Acredita em você. Confia.E sai desse banho, que essa água quente já está irritando.
Dor.Mais dor.Droga, preciso dormir, estou cansada, estou com sono, estou com fome.Mas eu vou conseguir.
Oi filha... não chora, não se assusta, a mamãe tá bem. Vem Aurora, fica aqui, é normal, é bom, é pra você ganhar um irmão ou irmã!
Dor.Dor diferente. Além de vir em ondas na barriga, também nas costas e... força.Uma força incrível, incontrolável.- Amor, na próxima contração segura minha perna.
A cabeça!- Paty, não faz força. Deixa que seu corpo vai fazer tudo sozinho.Outra.Mais uma.PLOFT! Bolsa estourou. Na calça do pai.
- Ai meu deus! Vai nascer! Vai nascer!!!Foooooorça! Nossa, não dói tanto assim. Nossa, que sensação incrível!- Amor, pode puxar o bebê.Ufa.Saiu.Dor? O que é isso?
Meu deus, que bebê lindo.Que bebê pequeno!Que sensação incrível!
Eu pari.Quando o mundo todo disse que eu não podia.Eu pari.EU.MEU corpo.Perfeito.Pelas mãos do meu amor. Doce, delicado, forte, confiante.Ao meu lado a cada 2, 5, 3 minutos. Apoiando. Amando. Confortando. Amparando.
- Você quer saber o que é o bebê?- Daqui há pouco. Agora eu só quero... amar".



Esse relato tão forte, sincero e catártico foi escrito de uma só vez por Patricia, enquanto Serena, o bebê nascido, mamava em seu peito. Ela. Patricia Alsina. Mãe de Aurora e Serena. Companheira de Erick. Erick, que segurou Serena em sua saída do corpo da mãe, em seu início de vida aqui fora, neste mundo.


Ele colocou a perna dela sobre seu ombro e segurou a filha. A filha metade fora, metade dentro. Com uma circular de cordão. Enquanto Aurora, a irmã, assistia sua irmãzinha chegar ao mundo.Uma família.Muitos amores.Muitos (re)nascimentos.Um parto domiciliar depois de uma cesárea repleta de violência. Depois de uma luta que durou exatos 22 meses. Patricia pariu sua segunda filha em casa. Em um parto domiciliar cuidadosamente planejado que se transformou em parto domiciliar desassistido, dada a intensidade e rapidez do nascimento - a equipe não chegou a tempo. E isso fez com que o pai atuasse como parteiro, segurando sua filha em sua chegada ao mundo. Patrícia pariu em casa, com uma pequena restrição de movimentos, já que quebrou a perna com 26 semanas de gestação, tirou o gesso com 39 e Serena nasceu com 40 semanas e 5 dias.Logo chegou a equipe, que ofereceu todos os atendimentos necessários, à mãe e à bebê.Inclusive a apoiando na espera de muitas horas pelo nascimento da placenta.
E assim nasceu Serena.Fruto também do nascimento de sua irmã, AuroraSe não fosse Aurora, Serena poderia ter nascido de outra maneira.Aurora e Serena estão ligadas para sempre. Não somente pelo fato de que são irmãs.Mas porque o nascimento de uma deu forças inimagináveis a uma mãe, para que lutasse pelo parto da outra.Após as fotos finais há um texto. Escrito por Patricia antes de ser mãe de Aurora e Serena, quando ainda era mãe apenas de Aurora.Leia.Você vai entender...
E assim nasceu Serena. Serena, Patrícia, Erick e Aurora.O que eles querem agora?Agora eles só querem amar...





Relato de Patrícia sobre o nascimento de Aurora, sua primeira filha. Que sem saber ajudou a segunda a nascer...
"A cesárea não é apenas o roubo do protagonismo do parto. Ela foi, para mim, o roubo de momentos únicos.Graças à ela, pessoas que nunca havia visto (e tampouco vi depois daquele dia), viram o rosto da minha filha antes de mim. Graças a ela, só pude ter minha filha em meus braços boas horas após o nascimento. Aliás, graças à anestesia e o torpor causado, não tenho lembrança desse momento. Quando finalmente me levaram ao quarto após a recuperação e a trouxeram para mim, estava tão cansada e grogue que, por mais que force a memória, não consigo lembrar. Não sei quem a entregou para mim, se o pai ou uma enfermeira. Não lembro desse primeiro momento único, pelo qual esperei 28 anos. Vejo as fotos, nossa Aurora ajeitadinha ao meu lado na maca, e não consigo lembrar. Do cheiro, da sensação de ter minha tão desejada filha ao meu lado. Uma lembrança apagada graças à anestesia. Também não lembro da primeira mamada, que aconteceu pouco após.Mas a dor do pós operatório... ah, essa sim! Lembro de não dormir à noite e implorar à enfermeira por algum remédio mais forte, já que os receitados não eram suficientes. Lembro de voltar para casa, e da ajuda para sair do carro, descer e subir escadas. Lembro de acordar com o choro da bebê à noite e o marido levantar e entregá-la em meus braços, porque eu não era capaz de sair da cama sem lágrimas de dor.E através dessa experiência, que deveria ter sido única e perfeita em minha vida, que conheci a humanização do parto. Não engoli a desculpa do médico, de não dilatar após 26h de trabalho de parto latente, e que me levou a optar por essa cirurgia após vomitar de dor e cansaço provocados pela ocitocina sintética. E fui estudando. Pelo meu parto perdido, passei por todas as fase: neguei e tentei me convencer que foi necessária; tive raiva por ser tão facilmente enganada; negociei comigo mesma que fiz tudo que pude e não foi o suficiente; deprimi e chorei tanto pelos momentos perdidos... até que, hoje, posso falar que aceitei.Aceitei minha parcela de culpa em não ter corrido atrás de toda a informação, aceitei que fui enganada em um momento de fragilidade.E comecei a lutar. Li, estudei, devorei todos os artigos que me caíam em mãos sobre gestação e parto. Passei a ajudar outras mulheres, para que não incorressem no mesmo erro, para que não sofressem e não precisarem conviver com essa cicatriz – muito mais forte na alma que na pele. Fui chamada inúmeras vezes de radical, de intrometida, de xiita. Perdi amigos queridos ao tentar mostrar que a realidade obstétrica é muito diferente do que a sociedade quer te fazer acreditar. Me tornei uma ativista, com muito orgulho, moderando dois grandes grupos de ajuda à mães e gestantes.E um ano e dois meses depois da cesárea, me descobri grávida outra vez".
O final da história... Bem, você já sabe.É assim que nascem bebês fruto de uma luta muito pessoal. Que, quando em coletivo, se chama "Movimento de Humanização do Parto".Que acolhe, que mobiliza, que sensibiliza e muda vidas.É, também, para isso que trabalhamos todos os dias.Que ignoramos ataques, ofensas e manifestações da mais pura ignorância.Para que pessoas reconstruam suas histórias.Para que vidas sejam ressignificadas.Para que pessoas nasçam repletas de amor.Para que sejam feitas as vontades dessas mulheres.Para livrá-las do que não é bom, do que machuca e fere para sempre.E se isso não for uma oração de celebração à vida, então não sei o que é.Amém.

Abrace. Só isso...



Quantas vezes por dia você abraça? 
Abraçar mesmo. Peito com peito, braços enlaçando a outra pessoa, olhos fechados de troca. Quantas vezes?
O que o número de abraços dados em um dia - ou em uma semana, ou em um mês, seja lá qual for a unidade de tempo que você queira considerar - diz sobre a qualidade da sua vida, das suas trocas, dos seus encontros, dos seus relacionamentos?
Se você está esperando uma resposta racional, científica, com protocolo de obtenção de dados validado metodologicamente, baseada em um artigo publicado em grande e respeitável periódico científico internacional, ou se você pensa em considerar como válida somente essa qualidade de resposta, esqueça. Feche o link, esqueça essa coisa de abraço, ignore a pergunta e vá em busca de números. 
Aqui você não os vai encontrar.
Aqui, agora, vamos falar de algo que adentra o domínio da subjetividade. Do impalpável. Daquilo que é fundamental e imensurável: afeto, carinho, solidariedade, troca, encontro de um peito com outro. De peitos conhecidos. Ou desconhecidos. Daquilo que um abraço profundo e verdadeiro quer dizer. Daquilo que é produzido em nós - e no outro - quando deixamos de lado nossas armaduras, ou nossos espinhos, para acolher e ser acolhido. Abraço.
Quantas vezes você abraçou quem você ama hoje?
Quantas vezes você abraçou suas crianças?
Qual a qualidade do abraço dado?
Onde estava sua mente enquanto abraçava?
Pode alguém viver sem ser abraçado? E sem abraçar?
Se pudéssemos comparar tempos históricos, será que estamos nos abraçando mais ou menos? Estamos nos tocando mais ou menos? Se menos, por que? Se mais, como?
Há alguma relação entre a quantidade e a qualidade dos abraços que damos em nossas filhas e filhos e o nível de tranquilidade infantil? De confiança estabelecida? De noite bem dormida? De qualidade do diálogo que se tem? De cólica? De medo? De terror noturno?
O que acontece quando nossas crianças, em crise de choro, de irritação, de tristeza, são abraçadas intensa, sincera e carinhosamente?
O que aprendem as crianças que são abraçadas com frequência? E que sabem que têm abraços em abundância esperando por elas?
Seus filhos e filhas (ou sobrinhos, sobrinhas, afilhados, as crianças do seu entorno) abraçam? Muito ou pouco? Se sim, por que e quando abraçam? E como aprenderam? Se não, por que não abraçam?
Um abraço pode ser trocado por outro tipo de interação que signifique a mesma coisa?
Por que trocá-lo? Para quê trocá-lo?
Não sei como é com você, mas comigo abraço também é termômetro. Sei que algo não está muito bem entre mim e o outro pelo tipo de abraço que nos damos. Ou pela sua falta. Ou pela sua raridade, ou pouca frequência. Da mesma forma, sei que posso confiar e me entregar a alguém também por seu abraço. Pelo tempo, pela força, pelo contato. Pelo motivo. E, mais importante, mais especial: pela falta de motivo.
Sei que há amor, carinho e confiança quando o abraço chega inesperadamente e envolve, e faz relaxar mesmo que por poucos segundos, e faz reconhecer o terreno como seguro. Seja com um amigo, com alguém da família, com um colega de trabalho, com filhos, com desconhecidos, com amante.
Abraço é como olhar: não há como menti-lo, fingi-lo, forçá-lo. Ainda que se tente, não é possível. Os corpos não se enganam.
Abraço já virou tabu? Será que um dia vai virar? Como seria uma vida sem abraços?
Por que estou fazendo essas perguntas, e falando sobre abraço, e não oferecendo respostas, mas fazendo perguntas?
No fim desta noite de domingo, depois de buscar minha filha na casa de seu pai, ela dormiu longa e profundamente no meu colo. Por mais de uma hora, esteve deitada em meu peito. Acordou e preferiu continuar ali. Mais tarde, depois do lanchinho noturno e do banho, já nos preparativos para dormir, ela me abraçou muito forte e disse algo que costuma dizer sempre: "Quero ficar no seu abraço pra sempre...". E eu disse que também queria, que o abraço dela é a melhor parte do meu dia. Ela então deitou, ganhou um beijo, me deu um beijo, e dormiu.
Nessa noite, eu não tinha grandes nem urgentes trabalhos a fazer e, assim, pude relaxar um pouco e pensar em outras coisas que não trabalho - quem tem a noite como dia útil, como eu, de domingo a quinta-feira, sabe que isso não acontece com tanta frequência... 
E naquele silêncio que se fez na casa, na mente, no corpo, senti uma coisa muito forte: saudade. Muita saudade. Saudade, especialmente, de alguns abraços específicos. Do abraço de quem está muito, muito longe. De quem nem está  mais aqui. De quem está distante, porém se fazendo perto. De quem não vejo há bastante tempo. E percebi que saudade também é ausência de abraço. Daquele abraço.
Como sentindo minha própria saudade, minha filha acordou e me chamou. Assim que apareci em seu quarto, ela me disse: "Mamãe, quero abraço". Sorri e a abracei demoradamente. Ela voltou a dormir em seguida.
Então saí e me dei conta do grande número de abraços que eu havia recebido apenas durante esse fim de semana. Muitos. E sinceros. Conhecidos e desconhecidos. De reconciliação e de reencontro. De encontro. De amizade. De amor. De "boa semana". E então a saudade passou.
O que será que sente uma criança que não é abraçada? Ou um adulto que não é abraçado? Alguém que não receba abraços com frequência? O que seria de um mundo em que abraços fossem trocados por eletrônicos? Por máquinas?
Não sei.
Mas desconfio de que não haveria muitos sorrisos, nem muito amor, nem muito gozo.

A vida parece não andar muito fácil nem muito simples pra ninguém ultimamente. Parece estarmos todos vivendo momentos de choque, quebra, confronto, dúvida, espera, momentos que nos colocam à prova, que testam nossos limites emocionais. As diferenças estão mais evidentes que as semelhanças. O confronto mais fácil que o encontro. A acidez mais fluida que a doçura.
Então eu deixei de postar agora um texto sobre psicofármacos e seus abusos para falar sobre abraço.
Porque talvez se tivéssemos mais abraços, precisaríamos de menos fármacos.
Se tivéssemos mais abraços... estaríamos todos mais juntos. Não parece meio óbvio?
Porque "no abraço, mais do que em palavras, as pessoas se gostam", disse Clarice Lispector.
E parece que estamos um pouco carentes disso.
Que em agosto, que tantos temem não sei porquê, a gente possa se abraçar mais.
Simplesmente abraçar.
E deixar todo esse ranço para trás.
E além de abraçar mais e ser mais abraçado, recomendo que você assista ao vídeo abaixo, que é bem curtinho.
Nada substitui calor humano.

Habilidades que as mulheres adquirem com a maternidade

Pesquisas comprovam: com a chegada dos filhos, desenvolvemos uma poderosa cesta de competências que nos ajuda tanto em nosso crescimento pessoal como profissional.


Isso mesmo! Podemos dizer que a maternidade traz um certo upgrade para as mulheres. As pesquisas comprovam. Por exemplo: em um estudo recente da Regus, consultoria especializada em flexibilizar ambientes de trabalho, feito com 65 mil executivos mundo afora, nada menos do que 65% dos entrevistados afirmaram que contratar mulheres com filhos pode aumentar a produtividade, a criatividade e melhorar o relacionamento com os clientes.
Estudos científicos começam a mostrar por que isso acontece. Um dos mais conhecidos foi conduzido pela neurocientista americana Pilyoung Kim e publicado na revista científicaBehavioral Neuroscience. Ela realizou exames de ressonância magnética do cérebro de 19 mães em dois momentos: nas primeiras semanas após o parto e entre o terceiro e o quarto mês depois do nascimento. Concluiu que há um aumento nas áreas do cérebro ligadas a raciocínio, planejamento e julgamento. Segundo os pesquisadores, esse fenômeno decorre de mudanças hormonais que ocorrem depois do parto, como o aumento dos níveis de ocitocina, estrogênio e prolactina. Tudo isso, claro, tem reflexos no comportamento da mulher.
Outro pesquisador que vem investigando esse assunto é o professor de biologia Adam Franssen, da Universidade de Longwood, em Virgínia, nos Estados Unidos. Sua tese é que as mulheres com filhos são melhores para resolver problemas, lidar com o stress e completar tarefas que envolvem memória. Para comprovar, tem desenvolvido com outros pesquisadores experimentos com ratos — no caso, fêmeas divididas em dois grupos, as com e as sem filhotes. Coloca os animais para realizar tarefas como orientar-se em um labirinto. Depois, analisa amostras de seus tecidos cerebrais. Na prancheta, perguntas como: será que a condição de mãe confere às fêmeas maior quantidade de neurônios? Ou os neurônios maternos são mais eficientes do que os de mulheres sem filhos? "Existem transformações nos neurônios", afirma Franssen em uma entrevista à revista Smithsonian Mag. "Eles aumentam de tamanho ou alguns potencializam sua capacidade de produzir proteína em uma parte do cérebro ou talvez conectem neurônios que não se conectavam antes", explica. Tudo isso, diz ele, para dar conta da enorme carga de trabalho que é cuidar de uma criança.

Na própria pele
Formada em biologia, Ligia Moreira Sena, que escreve o blog A Cientista Que Virou Mãe, acompanha as descobertas da neurobiologia do comportamento desde seus estudos de mestrado e doutorado. "Essa é uma parte da ciência que investiga as áreas do cérebro que atuam em determinados comportamentos e situações", explica. "Quando minha filha nasceu, passei a observar em mim mesma muitas coisas que já havia estudado", conta ela, mãe de Clara, hoje com 3 anos.
Ligia atua como moderadora de alguns grupos de mães em Florianópolis e percebeu que o que aconteceu com ela também é vivido por outras mulheres. "A neuroplasticidade é a capacidade de o cérebro se remodelar mediante determinadas situações. A maternidade é uma delas. Ele se adapta para que a gente consiga dar conta de muito mais coisas do que antes", explica ela. Com um bebê em casa, a gente precisa ter uma atenção seletiva maior, precisa estar focada nas atividades de cuidados com ele, mesmo tendo muitos outros estímulos. Da mesma forma, pegar uma coisa tão frágil no colo exige mais precisão de movimentos. "Isso sem contar coisas menos mensuráveis, como a intuição mais aguçada, a atenção maior para pequenos detalhes", afirma a bióloga.

Momento especial
Todas essas mudanças encontram terreno fértil para render bons frutos. "Em geral, a gestação é um momento de introspecção na vida da mulher, em que ela se volta para dentro, olha para si mesma. Na psicanálise, dizemos que ela faz uma pequena regressão e entra em contato com uma linguagem que a gente abandona quando cresce, a linguagem das emoções", observa a psicanalista Audrey Setton Lopez Souza, professora do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. "Nesse contexto, se a mulher se permitir, vai descobrir que sabe muito mais do que imagina."
Para Stella Angerami, especialista em Counseling e Coaching, sempre é tempo para aprender mais sobre si mesma. Especialmente quando a vida traz um estímulo tão poderoso quanto o nascimento de um filho. Afinal, se conseguimos realizar esse grande feito de gerar uma nova vida, podemos realizar muito mais. "Temos mais ânimo para experimentar o desenvolvimento de um novo comportamento, que antes ficava apenas no terreno da vontade", diz Stella. "Com o tempo, a mulher se vê diferente, melhor, mais feliz consigo mesma por ter conseguido transpor obstáculos que antes imaginava intransponíveis." Por tudo isso, explica Stella, é muito comum que a nova mamãe mude de comportamento e seja percebida social e profissionalmente assim. Mesmo internamente, ela começa a refletir sobre suas necessidades pessoais e de vida — incluindo anseios profissionais, comparações entre custo e benefício.
E como tirar partido de todas essas mudanças? "Primeiro, ela precisa entender e aceitar que essas novas habilidades estão presentes", observa Stella. "Depois, é importante refletir se delas nasce uma nova ocupação pessoal e profissional ou se apenas podem aprofundar o caminho que ela está seguindo e conquistar o que já tinha como plano para sua vida", conclui Stella. Para ajudar nessa reflexão, apresentamos a seguir algumas das principais habilidades que afloram ou são acentuadas depois que temos filhos.

Organização
Logo nos primeiros dias com um bebê novinho em casa, a mãe percebe que ele tem um ritmo, que sua rotina precisa ser marcada por um ritual. "Ele necessita disso para se acalmar, para ir aprendendo a esperar", explica a psicanalista Audrey Setton. "E a mãe também vai se acostumando a lidar com essa rotina, a organizar sua vida e a da casa para integrar esse novo ser", completa. Um aprendizado importantíssimo, uma vez que, mesmo que conte com uma rede de apoio (empregada, babá, creche, marido, avós...), culturalmente é a mulher que gerencia o universo doméstico. Ver quem faz o quê, otimizar recursos, delegar tarefas. "Para tudo isso, ela tem de desenvolver ou aguçar o seu senso de organização, a capacidade de antecipar problemas e prever soluções para eles", explica a psicóloga Rita Caligari, do Hospital e Maternidade São Camilo, em São Paulo. Já pensou ter que sair de noite à procura de fraldas descartáveis porque esqueceu de planejar as compras desse item ou verificar se o estoque doméstico era suficiente? Se trabalha fora, também precisará aplicar esse senso de organização a suas tarefas no escritório para dar conta de tudo no tempo certo, sem precisar ficar além do horário ou levar trabalho para casa.

Gerenciamento do tempo
Para equilibrar seus muitos papéis, a mulher com filhos precisa fazer uma reengenharia de tempo. Em sua agenda, as mesmas 24 horas de antes têm que render muito mais para que possa atender a todas as necessidades da sua vida como mãe, mulher, amiga, filha, profissional... "E, muito importante, sem esquecer de reservar um tempinho para si mesma", diz Stella. "Esse respiro é fundamental para que ela dê conta das outras coisas."

Relacionamento interpessoal
Com filhos, a mulher acaba tendo que lidar com uma rede de relações maior — babá, empregada, funcionários da creche, professores... "Aumenta mais a exposição a situações em que tem que lidar com diferenças, conflitos. Essas experiências estimulam a habilidade de se relacionar com pessoas", entende Rita. Para quem lidera uma equipe no trabalho, é um aprendizado valioso. "A maternidade nos ensina a nos colocar no lugar do outro, a ter uma escuta mais sensível para suas necessidades e seus desejos. É assim que a mãe consegue distinguir o que o bebê está querendo dizer com cada tipo de choro", explica a psicóloga Ana Merzel Kernkraut, coordenadora do Serviço de Psicologia do Hospital Israelita Albert Einstein, de São Paulo. Essa sensibilidade nos relacionamentos interpessoais é cada vez mais valorizada no mercado de trabalho.

Flexibilidade
Quando um filho entra em nossa vida, temos que lidar com muitas situações pelas quais nunca passamos antes sem perder o centro. "Aumenta muito o número de variáveis que a mulher precisa gerenciar", diz Stella. Esse exercício, segundo ela, é ótimo para afiar seu jogo de cintura. Ela tem uma reunião importante no trabalho logo cedo e a empregada liga avisando que não vai conseguir chegar por causa da greve de ônibus. E agora? "São muitas as situações como essa em que ela terá que improvisar, encontrar uma saída à queima-roupa. Tudo isso é um treino que a torna mais flexível", observa Rita.

Criatividade
Como uma coisa puxa a outra, os imprevistos acabam aguçando outra habilidade: a criatividade para buscar saídas, alternativas e soluções que nunca tinha imaginado.

Foco no desempenho da tarefa
Como o tempo é escasso, para dar conta de tudo, saber focar no que é essencial é outra habilidade valiosa. "Com isso, ela faz uma vez só e bem-feito", diz Stella.

As quatro crises do crescimento dos bebês


Seu filho enfrenta problemas para dormir,  se alimenta mal e anda agitado? Calma. Pode ser que ele esteja apenas atravessando uma crise comum à fase em que se encontra


 Primeiro trimestre: período simbiótico

Como começa a crise do primeiro trimestre?

A chegada aos 3 meses é um momento tão marcante que alguns autores falam de dois nascimentos: o biológico, que é o dia do parto, e o psicológico, que acontece quando o bebê completa 3 meses. Esse primeiro trimestre de vida é o que se chama de período simbiótico. “Para a criança, mãe e filho significam uma única palavra ‘mãefilho’. É assim que ela entende: como se fossem uma única pessoa”, diz, brincando, Leonardo Posternak, pediatra de São Paulo. A partir dos 3 meses, o bebê passa a olhar no olho da mãe, começa a se divertir, imita alguns gestos. Ele começa a sentir que a mãe não é só um bico de peito e, assim, começa a construir a imagem do outro.“É nesse período que a criança percebe que não está enroscado no tronco da árvore – que é a mãe. Ele está perto da árvore. Entende que precisa chamá-la para ter o que necessita – leite, colo ou fraldas limpas. Nessa hora, bate a ansiedade. É como se ela pensasse: ‘E agora? E se eu chamar e ninguém escutar? E se esse outro vai embora, o que eu faço?’ É aí que começa a crise”, explica Posternak.

Como saber se o filho está passando por uma crise?
A melhor maneira é ouvir o pediatra. “Algumas mães chegam ao consultório reclamando que há três dias o filho estava ótimo e, de repente, não quer mais mamar e tenta se afastar quando elas dão o peito. Outras reclamam que o bebê estava dormindo bem, mas, depois dos 3 meses, isso mudou. Ele acorda várias vezes chorando”, diz Leonardo Posternak, pediatra de São Paulo. “Há ainda as mães que reclamam que o bebê fica agitado sem motivo. Não quer ficar no colo, no berço, no bebê-conforto. Parece não estar confortável com nada que é oferecido”, continua. As queixas normalmente são parecidas e o seu pediatra saberá dizer se o bebê está com algum problema de saúde ou atravessando uma crise.

Quanto tempo dura a “crise do fim do período simbiótico”?
Essa crise dura em torno de 15 dias.

Nesse período, os bebês precisam ser medicados?
Não. Quando a criança atravessa uma crise, é muito importante que ela não seja medicada. “As mães sempre chegam ao consultório achando que a razão do desconforto tem algum aspecto orgânico: cólica, falta de leite, dente nascendo. Então explico que se trata de uma crise, um momento excelente para o crescimento”, ensina Leonardo Posternak, pediatra de São Paulo.

O que os pais devem fazer durante a crise?
Eles devem ficar calmos e entender que esse período vai passar. “Conhecendo os sintomas, os pais precisam dominar a ansiedade para que a criança não tenha que atravessar esse momento complicado num ambiente angustiante. Lembre-se de que o seu bebê precisa passar por essa crise para poder crescer”, explica o pediatra Leonardo Posternak, de São Paulo.

 Entre 5 e 6 meses: formação do triângulo familiar

Como começa a crise da formação do triângulo familiar?
Por mais que o pai tenha sido presente e ativo desde o nascimento do bebê, ele não teve uma relação tão simbiótica com o filho. Isso se dá por inúmeros motivos. Até mesmo porque ele não dispõe dos meses de licença-maternidade para ajudar nessa proximidade. Então, por volta do sexto mês de vida, o bebê, que já conhece a mãe, começa a reconhecer a figura do pai, dando início à formação do triângulo – e da crise.

Que sintomas a criança apresenta nessa crise?
“A criança tem um pouquinho de transtorno do sono, e o apetite diminui um pouco”, diz o pediatra Leonardo Posternak, de São Paulo. Mas essa crise costuma afetar mais as mães do que os bebês. “Nessa fase, a mãe se dá conta de que, para o filho ser saudável e feliz, ele precisa ter uma relação triangular e não uma relação de cordão umbilical com ela. Afinal, ninguém quer que o filho seja dependente a vida toda. É necessário que alguém corte essa simbiose. E esse é o papel do pai”, explica Posternak.

Com 6 meses, nascem os primeiros dentinhos. Essa etapa se confunde com a crise?
“Sim. Às vezes, isso acontece. As duas fases se confundem porque a dentição incomoda, dói e torna a criança aparentemente mais agressiva”, explica o pediatra Leonardo Posternak, de São Paulo.

Oito meses: separação ou angústia

Essa crise acontece sempre no oitavo mês?
Não exatamente. Essa é a crise do terceiro trimestre. “Embora seja incomum, algumas crianças começam a dar sinais da crise com 6 ou 7 meses. Outras mostram sintomas de angústia com 9 meses. Mas na maioria dos casos isso acontece mesmo no oitavo mês”, explica o pediatra Leonardo Posternak, de São Paulo.

Por que os pediatras dizem que essa é a crise mais significativa de todas?
“Porque essa é a que dura mais tempo e o transtorno do sono é muito acentuado: a criança pode chegar a acordar 15 vezes durante a noite, desperta muito assustada, com um choro intenso. Alguns pais ficam tão assustados que pensam que a criança caiu do berço porque é um choro diferente, desesperado”, esclarece o pediatra Leonardo Posternak, de São Paulo.

Quanto tempo dura a crise da angústia?
Demora um pouco mais que as outras: três ou quatro semanas.

Os pais devem levar a criança para dormir na cama deles?
O ideal é que o bebê durma no seu berço ou carrinho desde os primeiros dias de vida. “Dormir na mesma cama se dá mais por ansiedade dos pais do que por necessidade dos bebês. E os pais não dormem tranquilamente, pois ficam com medo de sufocar o bebê. Sem contar que isso pode ocasionar um afastamento na vida conjugal”, explica Ana Paula Cargnelutti Venturini, mestre em psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Além disso, segundo Ana Paula, a prática pode levar a criança a ficar muito dependente dos pais, buscando uma atenção cada vez maior.

Nessa fase, quando a criança chora de madrugada, é a mãe quem deve atender?
De preferência, sim. O pediatra Leonardo Posternak explica a razão: “Na fantasia do bebê, ele acha que, quando a mãe apaga a luz e fecha a porta, não volta nunca mais. Então, se ele chora durante a noite e é atendido pelo pai ou pela babá, acredita que a mãe não voltará mesmo”. A criança precisa passar por isso para ir entendendo que a presença da mãe pode ser seguida de ausências. “Nessa fase, é oportuno que não ocorram trocas dos cuidadores. Além de acordar assustado, o bebê pode reagir à presença de estranhos, chorando ou estranhando o colo”, reforça Ana Paula Cargnelutti Venturini, mestre em psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. “A mãe deve tentar acalmá-lo no próprio berço para não alterar substancialmente sua rotina”, ela sugere.

Quais os sintomas da crise da angústia?
Basicamente os mesmos das outras crises: alteração do sono, perda de apetite e agitação. “O sono é o que mais perturba. Além disso, a criança come muito mal, pior do que nas outras fases. E às vezes faz até pequenas greves de fome”, comenta o pediatra Leonardo Posternak, de São Paulo.

Qual a importância do objeto de transição nessa fase?
Nesse período de angústia, a criança começa a se apegar a algum objeto: pode ser um paninho, uma chupeta específica, um brinquedo. “Esse objeto representa a mãe, e é bom que ela brinque com o ursinho, por exemplo, que dê beijo, que deixe nele o seu cheiro. Isso vai ajudá-la a entender que à noite as coisas não desaparecem. A mãe pode sumir, mas o objeto continua ali e vai estar com ele quando acordar. Isso ajuda a criança a entender que esse afastamento não é uma perda”, ensina o pediatra Leonardo Posternak, de São Paulo.

Como ajudar a criança a escolher o objeto de transição?
Os pais não precisam se preocupar em estimular a escolha, que é feita naturalmente pelo bebê. “É importante que o objeto resista às agressões da criança e que ela mesma o reconstrua. A mãe não deve lavá-lo nem tentar consertá-lo”, explica Ana Paula Cargnelutti Venturini, mestre em psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.


1 ano: ambivalência/dependência/independência

Como é a crise do primeiro ano?
Esse período coincide com o andar: a criança quer caminhar, quer ser independente, mas ainda precisa de colo. “Ela já se sente capaz de explorar o ambiente, já abre gavetas, tira todas as roupas de dentro, mas ainda não vai muito longe da mãe. A crise se dá por essa vontade de ser independente e a necessidade de ser, ainda, dependente.”

Quais são os sintomas dessa crise?
“As mães chegam ao consultório reclamando que a criança começou a acordar à noite, a não comer e a ficar muito agitada durante o dia”, diagnostica o pediatra Leonardo Posternak, de São Paulo.

Os pais devem estimular a criança a caminhar?
Estimular, sim, mas jamais forçar. “O cérebro e as pernas ainda não estão combinados. Ela quer, porém não consegue, e isso gera angústia. A criança deve caminhar quando ela achar que pode”, alerta o pediatra Leonardo Posternak, de São Paulo.

Como as mães devem lidar com as crises?
“Não existe uma receita ideal. Como todo relacionamento, é preciso adaptação, tranquilidade e equilíbrio, além de um ambiente saudável e acolhedor. Essas fases podem ser difíceis, mas são extraordinárias e marcantes”, finaliza Betina Lahterman, pediatra da Universidade Federal de São Paulo.
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